Planejamento Societário na Constituição da Empresa: o que considerar antes de abrir sua empresa
- Bruna Guimarães

- 20 de out.
- 5 min de leitura
Abrir uma empresa é um momento de entusiasmo, mas também de decisões que vão refletir diretamente no futuro do negócio e da vida pessoal dos sócios. É nesse início que muitos cometem erros que só aparecem quando o problema já estourou: um sócio que quer sair sem aviso, um conflito com cônjuge em caso de separação, ou até dívidas da empresa atingindo o patrimônio da família.
Um bom contrato social não nasce de modelo pronto, mas sim da clareza dos sócios do que querem construir, dos riscos envolvidos e dos papéis de cada um. Por isso, o planejamento societário é uma etapa estratégica da constituição da empresa.
A seguir, iremos compartilhar alguns os pontos que se deve ter atenção no momento para construir uma sociedade segura, funcional e preparada para crescer:
1. Casamento, regime de bens e risco ao patrimônio familiar
Pode parecer que casamento e CNPJ não se misturam, mas o regime de bens escolhido impacta diretamente a estrutura societária, principalmente quando os sócios são casados ou pretendem constituir família.
Em regimes como a comunhão universal, o cônjuge tem direito à metade da participação societária, mesmo sem envolvimento direto na empresa. Já na comunhão parcial de bens, embora os bens adquiridos antes do casamento permaneçam particulares, as quotas adquiridas durante o casamento integram o patrimônio comum, salvo se houver cláusula de incomunicabilidade no contrato social.
No caso de separação ou falecimento, isso pode gerar direitos hereditários ou partilhas que interferem diretamente na sociedade, especialmente quando o cônjuge não atua na operação. Pensar nessas possibilidades desde o início é proteger o patrimônio da empresa e o equilíbrio societário
Além disso, se a empresa não estiver bem estruturada, há o risco de o patrimônio do casal ser atingido em ações judiciais, inclusive nas hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica. Não separar bem as finanças da empresa e da pessoa física pode custar caro.
O ideal é que o planejamento societário caminhe junto do planejamento patrimonial e conjugal. Não se trata apenas de cláusulas jurídicas, mas de segurança e visão de longo prazo.
2. Administração da empresa: evitar a paralisia e o caos
Quem vai tomar decisões? Quem pode assinar contratos? O que depende da aprovação de todos os sócios?
Essas perguntas precisam estar respondidas logo no início, de forma clara e objetiva no contrato social. Sociedades travadas por falta de previsões mínimas de administração são mais comuns do que se imagina e quando o conflito chega, a empresa paralisa.
É possível prever modelos diferentes: um sócio com plenos poderes, dois sócios com aprovação conjunta, poderes limitados a certos valores, entre outros. Não existe fórmula única, mas existe o que faz sentido para a operação e para o perfil dos envolvidos.
Organizar isso desde o início evita insegurança, disputas de poder e decisões unilaterais que prejudicam o negócio.
3. Objeto social: o que sua empresa realmente faz (e fará)
O objeto social não é um detalhe técnico, mas é nesse que definimos o escopo da atividade empresarial. Se estiver descrito de forma genérica ou mal estruturada pode causar problemas com o fisco, impedir o enquadramento em regimes tributários mais vantajosos, dificultar a emissão de notas fiscais e até limitar a operação da empresa.
Além de refletir a atividade atual, é essencial que o objeto social seja estrategicamente pensado para comportar futuras expansões ou linhas complementares. Assim, evita-se retrabalho com alterações contratuais toda vez que o negócio cresce ou se adapta ao mercado.
E mais: um objeto bem definido também contribui para a proteção jurídica da empresa, especialmente em disputas contratuais ou em casos de responsabilidade civil.
4. Sócios, quotas e regras claras desde o primeiro dia
Nem sempre todos os sócios contribuem com o mesmo capital, tempo ou conhecimento técnico e isso precisa ser refletido no contrato social. A divisão de quotas não precisa ser igualitária e, em muitos casos, essa igualdade aparente pode gerar desequilíbrios e frustrações no futuro.
Antes de definir quem terá qual porcentagem da sociedade, é essencial analisar: Quem está investindo capital? Quem trará a experiência técnica? Quem assumirá a gestão e as responsabilidades do dia a dia? Como será definida a retirada de lucros e o reinvestimento na empresa?
A partir dessas respostas, é possível estruturar um contrato social estratégico, com cláusulas que alinham expectativas e evitam desgastes entre os sócios, como: (i) Distribuição desproporcional de lucros (quando o esforço de um sócio justifica um recebimento maior); (ii) Cláusulas de vesting (especialmente úteis quando há sócios com entrada progressiva ou com vínculo condicionado a metas); (iii) Regras de retirada, exclusão e sucessão (essenciais para não travar a empresa em momentos críticos); (iv) Cláusula de não concorrência (para evitar conflitos com outros negócios dos sócios), entre outras ferramentas de governança que resguardam a operação.
Ignorar esses temas e seguir um modelo genérico pode parecer prático no início, mas é exatamente isso que abre brechas para brigas societárias, bloqueio de contas bancárias, disputas judiciais e paralisação das atividades.
Sociedades não se desfazem com a mesma facilidade que foram criadas.
5. Tributação: escolhas estratégicas desde o início
Nem sempre o Simples Nacional é o melhor caminho. Muitas empresas escolhem esse regime por ser mais conhecido, mas esquecem de avaliar margem de lucro, tipo de serviço, carga tributária real e possibilidades de economia.
Um planejamento tributário bem-feito desde a constituição pode evitar pagamentos excessivos, reduzir riscos fiscais e até abrir caminho para estruturas mais eficientes, como holdings ou empresas em regime de lucro presumido.
E tudo isso está ligado ao contrato social: tanto a escolha do regime quanto o objeto social e a estrutura societária impactam diretamente na carga tributária da empresa.
Planejar a sociedade é pensar no futuro da empresa com responsabilidade e estratégia.
Mais do que um passo burocrático, a constituição societária define as bases jurídicas que vão sustentar o negócio, proteger os sócios e reduzir riscos em momentos de crescimento ou conflito.
Decisões como o regime de bens, a forma de administração, a definição do objeto social e a distribuição de quotas, bem como a governança da sociedade não são meros formulários, são escolhas que refletem na segurança patrimonial, na relação entre sócios e na saúde jurídica da empresa.
Se você está formalizando sua sociedade ou percebe que a estrutura atual não acompanha mais a realidade do negócio, este é o momento de ajustar o alicerce. Um planejamento bem-feito hoje evita prejuízos (e dores de cabeça) no futuro.




